A exigência de certificação digital —
que confirma a autenticidade de documentos e declarações virtuais — vai ser
ampliada. As empresas optantes do Simples com mais de cinco empregados
precisarão de um cartão ou token especial para apresentar a Guia de
Recolhimento do FGTS e de Informações à Previdência Social (Gfip). Sem a
certificação, enviar as informações trabalhistas, fiscais e previdenciárias ao
governo ficará mais difícil.
A certificação, que serve como uma
assinatura eletrônica, promete dar mais segurança ao envio dos dados, mas é
alvo de reclamações devido ao custo que a acompanha — R$ 135 a R$ 515,
dependendo do modelo escolhido e do tempo de validade. A exigência da presença
do empresário em um posto de atendimento para a emissão do certificado também
dá dor de cabeça a quem precisa do documento.
De acordo com a Receita Federal, a
crescente utilização da certificação digital é fruto da utilização massiva de
documentos em formato digital e da necessidade de garantir juridicamente sua
validade, integridade e autenticidade. O Fisco considera que a certificação é
benéfica por melhorar seus controles; dar mais agilidade às empresas; e
garantir os direitos dos cidadãos no mundo digital.
O prazo para a adoção do certificado
digital pelas empresas do Simples foi estabelecido pelo governo em agosto do
ano passado. As primeiras que tiveram de se adequar à medida, até 31 de
dezembro de 2015, foram as com mais de dez empregados. Em seguida, em janeiro,
foi a vez das que têm mais de oito. A próxima etapa ocorrerá em janeiro de 2017
e afetará empresas com mais de três pessoas.
Iágaro Jung Martins, subsecretário de
Fiscalização da Receita, defende a certificação digital e ressalta que os
empresários tiveram quase um ano para se preparar. Ele ressalta que o mecanismo
dá mais garantia ao empregador e ao empregado.
— Essas informações da Gfip são de
altíssima relevância e terão efeito daqui a 30 anos. Com a certificação, não há
como negar a autenticidade desses dados. Ou seja, isso dá segurança jurídica.
São informações importantes para quando o trabalhador, por exemplo, se
aposentar.
Para obter o certificado digital, o
empresário precisa ir a um ponto de atendimento de uma empresa certificadora —
Correios, Certsign, Serasa Experian, DocCloud, entre outras — com documentos
pessoais e da empresa. O processo é presencial. Se por um lado isso dá mais
segurança, uma vez que dificulta a possibilidade de fraude, por outro, é
apontado como um empecilho para emissão, já que depende do deslocamento do
empresário. Se a empresa tiver mais de um sócio responsável por ela no contrato
social, ambos terão de estar presentes para a emissão do certificado.
Mais segurança
Até esta quinta-feira, as empresas que
não tinham certificado digital entravam no site da Caixa, preenchiam os dados
emitiam a Gfip para pagá-la no banco. É um processo que poderia ser feito por
qualquer um e mais suscetível a fraudes. Com a certificação, que garante a
identidade da empresa e de seu responsável no meio on-line, o acesso só é
permitido com a senha do certificado digital. O próprio empresário pode fazer
esse procedimento ou dar uma procuração eletrônica a seu contador para que ele
o faça.
— Quando o empresário entra na página
da Caixa, por exemplo, insere sua senha e faz a sincronia entre sua chave
privada e a pública. E nenhum hacker consegue quebrar isso de forma rápida.
Temos estudos que indicam, que uma chave com 256 bytes demoraria um ano para
ser quebrada. Trabalhamos hoje com 2.048 bytes — explica Roni Moreira, diretor
executivo da empresa certificadora DocCloud.
Martins, da Receita, alerta que o
cartão ou o token do certificado jamais pode ser entregue ao contador. Ele fica
com o empresário. O certificado é pessoal e intransferível. Entregá-lo é o
mesmo que dar o cartão do banco e a senha a uma outra pessoa, explica.
O subsecretário da Receita afirma que a
empresa que ainda não tiver com o certificado em mãos nos próximos dias terá
como honrar suas obrigações trabalhistas, previdenciárias e trabalhistas. Para
isso, será preciso fazer uma procuração eletrônica em favor do contador para
que ele envie os dados com o seu certificado pessoal ou da empresa de
contabilidade.
Leonardo Gonçalves, diretor da
Certisign, diz que a adesão dos empresários tem sido bastante interessante, não
só por causa da obrigatoriedade, mas também devido à agilidade e à redução de
custos proporcionada pelo certificado, que permite operações bancárias e
emissão de certidão negativa, por exemplo. E ele espera uma aumento da procura
nos próximos dias.
— Já percebemos um aumento, que deve se
intensificar na primeira semana de julho. Mas o brasileiro deixa tudo para a
última hora. Esperamos um aumento de 10% ao longo do mês frente a igual período
do ano passado.
O custo do certificado varia de R$ 135
a R$ 515, dependendo do tipo de certificado e do tempo de validade. O mais
comprado por pequenas e médias empresas custa cerca de R$ 200. Para facilitar a
aquisição, as empresas estão fazendo promoções e oferecendo parcelamentos em
até 12 vezes sem juros no cartão de crédito.
Empresários reclamam
Josias Pereira, da Licitus
Contabilidade, ressalta a importância do certificado digital para as tarefas do
contador, desde o acesso ao extrato do FGTS à desvinculação de um funcionário.
O processo, no entanto, esbarra no custo e na falta de divulgação no caso dos
pequenos empresários. Dependendo do tipo de certificado que o cliente precisa,
Pereira conta que é inviável o orçamento, gerando prejuízo inclusive para a
execução do serviço dos escritórios de contabilidade.
— Essa obrigatoriedade acaba trazendo
transtorno para as empresas de pequeno porte. Há um certificado próprio a
pequenas e médias que mesmo assim é custoso. Não é nem uma questão de prazo. É
que a receita é baixa, o lucro é baixo, e alguns clientes não entendem a
necessidade. Acham que o governo está cobrando mais, jogando o custo para o
empregador, e que nós contadores temos que achar uma alternativa por ser
inviável. Quando dizemos que não há, questionam até mesmo a gente — ressalta
Pereira.
Sem o certificado obrigatório, diz o
contador, não há como realizar tarefas que os clientes pedem. Um transtorno
para colocar em dia as declarações dos benefícios e dos encargos trabalhistas.
Na empresa em que trabalha, os microempresários, de faturamento baixo ou
mediano, são maioria. E a maior parte deles ainda não conta com o documento.
Muitos sequer sabem do que se trata ou que precisam dar entrada no processo. A
divulgação, para ele, por ser discreta, acaba restrita ao meio contábil. Coube
a Pereira e seus colegas “iniciar a cobrança em 99,9% dos casos, para evitar
problemas futuros”.
— A maioria não tinha certificado até
pela própria burocracia, que exige validação presencial. O empresário no Brasil
trabalha muito, não tem muito tempo. Além disso, vi outra dia uma certificadora
exigir duas identificações senão não faria o serviço. Como é um processo em
paralelo ao trabalho, o empregador chega lá e é impedido pela burocratização da
documentação necessária. Nisso, ele vai empurrando com a barriga.
A Receita Federal e as certificadoras
afirmam que a presença do responsável pela empresa é indispensável para
garantir a transparência e segurança do processo. Além disso, comparam a a
exigência a uma ida a um cartório, que também é cobrada para determinados
procedimentos.
— A visita ao posto de certificação é
como um procedimento autenticação no cartório. E todas as empresas tiveram de
assinar um contrato em cartório. Tenho certeza de que vão conseguir emitir o
certificado — defende Martins, da Receita.
Falta de clareza
Outro problema em relação ao
certificado digital é a falta de clareza em relação a seu uso, os modelos
necessários em cada caso e as exigências de emissão de cada um.
— O empresário não entende porque tem
que ir a até a certificadora. Também não entende que o certificado é um
documento eletrônico que poupa tempo e é mais seguro. Quando ele entende tudo
isso percebe que o rigor é importante — explica Claudia Tazitu, diretora de
certificação da Serasa Experian.
Roberta Ezar, sócia de tecnologia para
impostos da EY (Ernst & Young), elogia as exigências para a emissão do
certificado, mas critica a falta de informações sobre como emitir e as
particularidadees de cada caso:
— Na forma como foi construído, é
difícil burlar o sistema, que é bem confiável. No México, por exemplo, onde não
há certificação, há muitos casos de fraude. Um documento é enviado e pode ser
alterado. Aqui, com a certificação, qualquer alteração invalida a autenticidade
do documento. O ruim é que, em alguns casos, pode-se utilizar uma procuração
para fazer o certificado. Em outros, não. Às vezes, por causa disso, o
empresário acaba perdendo prazos.
A certificação de Carlos Roberto Silva,
um dos clientes de Pereira, expirou recentemente. Há um ano, ele soube que o
certificado seria obrigatório e se adiantou. Sua empresa, a CRS Construções,
assina a carteira de sete funcionários. Em cerca de um mês, já estava com o
processo concluído. Uma tramitação, segundo ele, de que não tem o que reclamar.
— No início, dá trabalho. É um custo, é
verdade, mas depois traz benefícios na estrutura financeira. O certificado foi
um facilitador para mim que sou prestador de serviço, para meus empregados e
para os meus clientes, que recebem a nota fiscal por e-mail, mais organizada.
Compensou em agilidade e satisfação.
Silva não considerou a burocracia
pesada e comemora o fato de hoje não precisar preencher tantos documentos à
mão. Outra vantagem, diz, é a possibilidade de verificar informações pela
internet para ter uma noção de quanto pagará em impostos e para acessar os
dados de algum CNPJ ou CPF para quem precise emitir nota na hora.
A exigência é nacional e isso significa
que mesmo empresas de pequeno porte do interior terão de se adequar à regra. As
principais certificadoras têm pontos de atendimento em todos os estados
brasileiros, mas reconhecem que não estão em todos os municípios. E lembram que
oferecem o serviço de visita ao empresário. Só que isso tem um custo. E não é
nada barato: num grande centro sai em média a R$ 250.
Para Paulo Henrique Barbosa Pêgas, professor
de contabilidade tributária do Ibmec/RJ e contador do BNDES, o pequeno
empresário não entende o que é a certificação:
— Ele entende é do seu negócio e acha o
modelo de cobrança de tributos desorganizado e complexo, sendo mais um elemento
que dificulta o desenvolvimento dos pequenos negócios.
Momento não é propício
Pêgas também ressalta que o momento
econômico não é o mais adequado para a imposição de exigências aos empresários.
O cenário atual, afirma, pede uma reforma tributária efetiva, simplificando um
modelo tributário arcaico, prolixo e que não incentiva o empreendedorismo.
— Pena que a grande maioria da
população brasileira fique indiferente ao tema, pois a pressão popular por uma
mudança no modelo tributário iria obrigar nossos representantes a priorizar o
tema, no meu entender fundamental para tornar o Brasil um país efetivamente
forte.
Se os empresários reclamam, pelo menos
em um primeiro momento, as certificadoras só têm a comemorar. O mercado cresceu
39,8% no ano passado frente a 2014. A DocCloud se peraparou para o aumento da
procura e espera um crescimento de 70% em julho. A Certisgn espera uma alta de
10%. Já a Serasa Experian acredita que haverá um aumento, mas não o
quantificou.
Antonio Cangiano, diretor executivo da
Associação Nacional de Certificação Digital (ANCD), que representa empresas que
detêm 80% do mercado, diz que quase 5 milhões de empresas no país estão no
Simples.
— Há 7 milhões de certificados ativos.
São 4,5 milhões de pessoas jurídicas e 2,5 milhões de pessoas físicas. Há quase
5 milhões de empresas dentro do Simples — afirma. — É uma facilidade induzida
pelo governo. O objetivo é deixar mais público, de uso geral. Há 15 anos a
certificação digital está no país e isso começou com a nota fiscal eletrônica.
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